O diretor Christopher Nolan tinha uma missão ingrata. Em 2003, “Batman Begins” redefiniu a figura do herói e salvou uma franquia que já estava desgastada. Cinco anos depois veio “O Cavaleiro das Trevas” – e o buzz em torno da atuação impecável de Heath Ledger como o Coringa fez o filme abocanhar mais de 1 bilhão de dólares. Para boa parte do público, o terrorista insano era a principal atração do longa, e Batman, um mero coadjuvante. Como superar o sucesso de crítica do primeiro filme e o apelo de público do segundo e ainda fechar bem a trilogia? Nolan achou a resposta para essa pergunta no mesmo lugar onde encontrou a inspiração para os filmes anteriores: nos arcos mais sombrios das histórias em quadrinhos, inaugurados em 1986 com “O Cavaleiro das Trevas”, de Frank Miller.
O emaranhado de referências é a principal virtude do filme, mas uma virtude perigosa e nada democrática. Quem não é fã pode se perder com os novos personagens e suas subtramas, que se alternam no começo e só se misturam na segunda metade (ou seja, depois de uma hora e meia). Aliás, a duração do filme não ajuda muito os espectadores impacientes ou desatentos aos detalhes.
Desde o último filme, foram quatro anos da vida real e oito na ficção. Não há bandidos nas ruas, mas Gotham não está em paz – é como se a trégua da criminalidade fosse boa demais para ser verdade e algo de ruim pudesse acontecer a qualquer momento. E é claro que acontece. Bane é um terrorista mascarado que quer tirar o poder das mãos dos ricos e das autoridades militares e colocá-lo nas mãos do povo. Com o tempo, você percebe que esta é só a ponta do iceberg de um plano muito maior, que faz com que a insanidade do Coringa pareça travessura de criança. Batman, que desapareceu depois de assumir a culpa pelo assassinato de Harvey Dent, precisa sair da Batcaverna para detê-lo. Afinal, o vilão tem uma bomba atômica e não tem medo de usá-la.
Os efeitos visuais são incríveis: tem explosão, ponte caindo, estádio de futebol ruindo terra abaixo, tudo o que um bom filme de ação precisa ter. O “Morcego”, veículo que substitui o Tumbler (o Batmóvel dos últimos filmes), é impressionante e a moto que Selina Kyle usa é totalmente badass (em muitos sentidos). O elenco, que reúne alguns dos atores preferidos de Christopher Nolan, não está lá por acaso – lembre-se disso quando achar que Marion Cotillard está desperdiçada.
O problema é que este não é um filme de super-herói. Sim, o Batman usa uma fantasia e luta contra o mal. Mas na comparação com os filmes de super-herói lançados recentemente, a diferença é muito gritante. “Os Vingadores” e “O Espetacular Homem-Aranha”, por exemplo, são ótimos filmes. Mas nenhum dos dois tem a complexidade da trilogia de Nolan. O diretor de “A Origem” prefere os contrastes altos à explosão de cores e seu foco está mais nas dúvidas do que nas certezas dos personagens. Enquanto Tony Stark vence porque acredita em si mesmo, Bruce Wayne (bem menos simpático) se arrisca e se sacrifica porque não tem mais nada a perder. Enquanto Peter Parker leva os conselhos de Tio Ben como um mantra, Bruce é orgulhoso demais para compreender quando Alfred se mete em sua vida.
“O Cavaleiro das Trevas Ressurge” não tem o charme da novidade e nem tanto apelo popular. Mas amarra as pontas da trilogia e transforma em saga. A base de um bom personagem é a transformação pela qual ele passa. Em “Begins”, Bruce Wayne é um jovem materialista movido pela vingança. No segundo filme, sua autoconfiança é comprometida por causa de um vilão incontrolável. De vigilante, passou a assumir, ao mesmo tempo, os postos de vilão (para as autoridades) e mártir (para os fracos e oprimidos de Gotham). Agora, ele é herói de verdade.
É possível que você não saia ofegante do cinema. E talvez não tenha aquela sensação de “este-foi-o-melhor-filme-da-minha-vida” que alguns filmes causam logo depois que acabam. Com sorte, você vai querer ver de novo para tirar suas conclusões. Muito possivelmente, vai achar o final decepcionante. Mas, mesmo diante dos defeitos do filme, não poderá dizer que não foi uma conclusão coerente para uma boa trilogia que entra não apenas para a história dos filmes baseados em HQs, mas para a história do cinema.
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