Nos anos 2000 a internet já era popular, mas nada comparado ao
panorama atual, com a explosão das redes sociais e a facilidade em
encontrar dados pessoais sobre qualquer um. Na década passada, os fóruns
de discussão destacavam-se entre outros sites, já que eram páginas
movimentadas e restritas a temas específicos, como certos esportes,
filmes ou games.
Foi em um desses fóruns que surgiu um dos personagens mais
misteriosos da internet. A partir de conversas com outros membros do
local, John Titor dizia ser um viajante do tempo. Isso mesmo: ele teria vindo de anos futuros para cumprir um determinado objetivo e conversar com a população daquela época.
O que poderia ser apenas uma brincadeira de mau gosto ganhou
proporções incríveis – e um mistério que até hoje intriga quem utiliza a
rede mundial de computadores.
O viajante misterioso
“Saudações. Eu sou um viajante do tempo do ano de 2036”. Era assim
que começava o primeiro dos vários textos assinados por John Titor em
2001, no já extinto fórum Artbell. De início, a mensagem causou espanto,
polêmica e até piadinhas. Após alguns questionamentos, o tal visitante
de outro período começou a esclarecer algumas questões sobre as próximas
décadas com uma segurança incomum.
Titor dizia morar com a família em uma base militar em Tampa, no
estado norte-americano da Flórida. Antes de “aterrissar” no ano de 2001
para questões particulares, ele tinha uma missão no ano de 1975. O
objetivo era coletar um 5100, um dos primeiros modelos de computador
pessoal fabricado pela IBM. De acordo com o viajante, a máquina possuía
uma “função acidental” e única (uma peça, talvez?) que foi pouco
divulgada pela empresa – mas era algo essencial para traduzir códigos em
2036.
O "emblema militar" encontrado nos documentos mostrados pelo viajante.
(Fonte da imagem: Anomalies)
A interação com os membros do fórum foi pacífica. Muitos perguntavam
quem ganhou torneios esportivos ao longo dos anos e em quais empresas
valia a pena investir, por exemplo, mas Titor não revelou nada que
pudesse ser “eticamente incorreto”, já que ele estaria fornecendo
informações privilegiadas ao povo do passado.
Durante os meses de debates, o homem conquistou a opinião de algumas
pessoas, que concordavam que era impossível provar que ele era um
viajante temporal, mas que achavam os argumentos bastante convincentes.
O mundo em 2036
Titor fez longas postagens sobre as lembranças que ele tinha de seu
ano original, especialmente sobre a política norte-americana e alguns
assuntos como saúde e tecnologia.
De acordo com ele, o meio ambiente estaria infestado por radiação e
doenças, o que obriga a produção de alimentos em locais internos. Já as
universidades seriam ainda mais importantes, já que possuem bibliotecas.
E 2012? “Aconteceram coisas incomuns neste ano, mas nada que leve o
mundo ao fim”.
Apesar de o cotidiano no futuro ser como “a vida em uma fazenda”, as
pessoas passariam “muito mais tempo lendo e conversando pessoalmente”.
Já a religião seria bastante valorizada – e as diversas crenças bem mais
toleradas.
Mas nem tudo são flores no futuro:
de acordo com ele, a partir de 2004, uma guerra civil começaria nos
Estados Unidos após o resultado das eleições presidenciais daquele ano. O
conflito ganharia contornos mundiais até que, em 2015, a Rússia lança
um míssil no país, dizimando estados inteiros e começando uma curta e
intensa Terceira Guerra Mundial.
Isso teria causado uma fragmentação dos Estados Unidos em cinco
unidades com cinco presidentes, além de uma nova Constituição. Além
disso, água seria muito difícil de ser obtida e itens simples em nosso
cotidiano, como bicicletas, seriam bastante raros.
Algumas previsões são verossímeis: ele diz que as plataformas móveis
seriam essenciais, já que você teria acesso à tecnologia mesmo fora de
casa, por exemplo. Além disso, ele alerta para os riscos da doença de
Creutzfeldt-Jakob, a vaca louca, que preocuparia a pecuária nos anos
seguintes. Mas ele errou em várias coisas, como ao afirmar que não
haveria a realização de Jogos Olímpicos após as guerras civis de 2005.
A máquina do tempo
Sobre o dispositivo utilizado por Titor para se locomover no tempo, o
C204 Gravity Distortion Time Displacement Unit, apenas alguns detalhes
foram fornecidos. Sabemos que se trata de uma máquina complexa acoplada
em um carro (um Corvette), como o conceito usado em “De Volta para o Futuro”.
Parte do painel do carro que seria a máquina do tempo. (Fonte da imagem: Anomalies)
A máquina envolve campos magnéticos, baterias, zonas de raios X e
conceitos eletrônicos avançados. Titor até postou trechos de um manual
de uso que ele trazia consigo – e quem o analisou disse que aquilo
realmente fazia algum sentido.
Alguns rascunhos da máquina do tempo de John Titor. (Fonte da imagem: Anomalies)
Além disso, ele alerta que alguns eventos descritos por ele podem não
acontecer. Essa concepção clássica da ciência diz que, ao viajar para o
passado e alertar a humanidade, Titor criou duas linhas do tempo, sendo
uma delas a original (vivida por Titor) e a outra paralela (criada após
a viagem no tempo). O conhecimento avançado sobre o assunto indica que,
se ele era uma fraude, ao menos sabia do que estava falando.
Após cerca de quatro meses debatendo, Titor avisou que aquele seria
seu último dia naquele ano – e não realizou outra postagem desde então.
Após o sumiço, quem manteve contato com o viajante procurou
informações sobre um “John Titor” ou uma família com tal sobrenome. Um
ou outro registro foi encontrado, mas nada que levasse a uma conclusão
sobre quem era o sujeito. Além disso, ninguém foi capaz de rastrear o IP
ou localizar as postagens na época.
Mas nem por isso a febre John Titor passou: sites especializados e
cheios de conteúdo em inglês surgiram para compilar as informações
passadas pelo viajante e analisar suas falas, como o
John Titor Times, o
John Titor’s Story e o
Anomalies (que tem todas as postagens na íntegra).
Algumas das questões levantadas por Titor nunca foram respondidas – e
ninguém apareceu por aí dizendo ser o autor da brincadeira. Caso ele
exista de verdade, de acordo com as postagens, em 2011 ele já seria uma
criança. Será que ele desconfia do futuro grandioso destinado a ele?
Nós, pelo menos, já sabemos de tudo.
@Coelho
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